Mapas para cruzar fronteiras
André Leal
Para Ronald Duarte, “Desilha é pular do abismo!” É esse pulo que faz com que uma disciplina acadêmica para artistas-pesquisadores se torne um verbo: desilhar, ou desilhar-se. Verbo para o qual nunca haverá um verbete em dicionário algum, ou pelo menos nunca poderá haver um verbete estanque que feche os sentidos de desilhar. Porque desilhar-se é se abrir para as coletividades com as quais você compartilha intensamente trabalhos e vivências ao longo de um semestre letivo, em saídas pelas localidades mais inesperadas da cidade, nas brechas que vamos procurando, encontrando e abrindo no asfalto da metrópole carioca.
A ilha do Fundão, ‘berço’ do Desilha, e a favela da Maré estão separadas por míseros 280 passos, mas as contradições que envolvem as duas ilhas – uma criada artificialmente em nome de um saber excludente e imbuído da lógica do progresso iluminista, a outra um aterro criado pelos trabalhadores precarizados excluídos da cidade formal – transformam essa distância em um abismo incalculável. Transpor essa ponte, de barco, a pé, de ônibus ou até mesmo de carro é parte inerente de desilhar(-se). Mesmo que essa experiência não leve a nenhum lugar objetivo, apenas a uma fruição vespertina entre sorrisos infantis, garfadas de feijoada, cracudinhas de Antarctica estupidamente geladas e a projeção do filme Panteras Negras. Mas sem ter dado esses 280 passos, nenhuma experiência desilhante poderia ter acontecido. É preciso estar lá para que algo (ou nada) aconteça, e como diria Hélio Oiticica, não achar nada também é uma das possibilidades do seu programa ambiental.
Apresentamos aqui um recorte – mínimo (máximo?) – de trabalhos apresentados nas cinco edições do curso Desilha desde que assumiu seu formato atual, zarpando de um píer no Fundão para contornar a ilha e reconhecer suas bordas. Quarenta e dois artistas que apresentaram trabalhos em diferentes formatos e momentos pelos quais o país atravessou nos últimos cinco anos e que emergem aqui para serem revisitados com novos olhos e em contato uns com os outros. São notas, indicações, mapas, que apontam possíveis rumos para um norte que cada vez mais é o sul, um sul festivo e afetivo para se contrapor aos fascismos que constroem muros no lugar de pontes. Convidamos todos a desilharem conosco!